terça-feira, 25 de agosto de 2009

Exagerar nos pontos fortes pode se tornar uma armadilha para o profissional. Saiba como se manter em equilíbrio

Valorize seus pontos fortes. Provavelmente, você já recebeu essa orientação algumas vezes em sua carreira. É um ótimo conselho e faz todo o sentido. Afinal, se você já tem uma aptidão natural, investir nessa habilidade parece ser o caminho mais eficaz para obter bons resultados. Pelo mesmo raciocínio, tentar aprimorar pontos fracos soa como perda de tempo, já que você dificilmente se tornará excelente naquilo em que tem pouca ou nenhuma vocação. Esse é o senso comum que baseia escolhas de carreira e decisões diárias da maioria dos profissionais. Esse modo de pensar e agir não está errado, mas tem limites — e pouca gente percebe isso. Se você se apoia demais em uma competência, corre o risco de pecar pelo excesso. E aí o que era qualidade vira defeito. “Ao se concentrar em um determinado comportamento que julgam positivo, os profissionais são incapazes de perceber o próprio exagero”, diz em entrevista a VOCÊ S/A o consultor americano Robert E. Kaplan (não confundir com o guru quase homônimo Robert S. Kaplan, criador do método Balanced Scorecard), que publicou um artigo recente sobre o assunto na edição americana da revista Harvard Business Review. Dono de uma ferramenta de avaliação de desempenho 360o, Kaplan fez uma pesquisa com 1 200 gerentes e diretores e constatou que 55% deles são acusados por pares e subordinados de exagerar na dose em pelo menos um comportamento. As pessoas tendem a se focar em um determinado comportamento, algo que pode ter sido reconhecido como qualidade em alguma empresa ou que favoreceu o profissional em uma determinada situação. “O que funcionou no passado serve como um reforço de imagem para o profissional”, diz Marcelo Cuellar, gerente da divisão de RH da Michael Page. Como exemplo, basta pensar em um executivo de vendas que tem como característica o espírito empreendedor, no qual coloca suas fichas. Ao se concentrar apenas na execução, ele deixa de pensar nos assuntos estratégicos — e aí seu desempenho cai. A culpa não é apenas do profissional. Segundo Robert Kaplan, os processos de desenvolvimento de liderança e de avaliação de desempenho, na maioria das vezes, dividem as qualidades entre fortes e fracas e ignoram quando o pêndulo da balança pende exageradamente para o extremo mais favorável ao profissional. “Os instrumentos de avaliação não consideram uma lição fundamental de décadas de investigação sobre falhas comportamentais: mais não é sempre melhor, e executivos perdem seus empregos quando seus pontos fortes viram fracos com o uso exagerado”, diz o especialista. Kaplan diz que é possível detectar e corrigir os excessos, as que este exercício exige atenção diária e leva tempo. Trata-se de uma escolha complexa: como abandonar um hábito que até agora era visto como positivo. Kaplan sugere perguntar aos colegas: “O que mais preciso fazer?”, “O que devo parar de fazer?” e “O que devo continuar fazendo?”



Como descobrir se você exagera na dose

1. INCENTIVE O FEEDBACK
Incentive os colegas a lhe darem feedback. “As pessoas é que vão dar o sinal amarelo”, diz David Lingerfelt, diretor da consultoria Mariaca, de São Paulo. Robert Kaplan sugere perguntar aos colegas: “O que mais preciso fazer?”, “O que devo parar de fazer?” e “O que devo continuar fazendo?”.

2. QUESTIONE-SE
Quais as características que você gostaria de ter como líder? Faça uma lista e cheque se você está utilizando-as em excesso. Segundo Robert Kaplan, o exercício força a pensar em um novo caminho, em desafiar alguns de seus paradigmas sobre liderança. Depois de diagnosticar o problema e tomar consciência da necessidade de mudança, é preciso exercer o novo comportamento. “Desfaça o gatilho antes de agir de determinada maneira, sempre
com muita disciplina e determinação”, diz Fernanda Pomin, sócia-diretora da Korn/Ferry.

4. BUSQUE O EQUILÍBRIO
Quanto maior a sua preferência por um estilo de liderança, maior a falta de afinidade com o seu oposto. “Aprender outro comportamento é um exercício para se criar um novo repertório”, diz a diretora de desenvolvimento da Right Management, Marisabel Ribeiro. Assim, você terá dois repertórios e será hábil para escolher o mais apropriado diante de uma nova situação.

Exageros mais comuns


Politiqueiro
Tem talento para o jogo corporativo. Mas, de tanto fazer política, começa a soar falso. Fala muito e entrega pouco. As ações são diferentes do discurso.
COMO CORRIGIR: As pessoas esperam opinião, decisão e assertividade desde que na medida certa. Não se comprometa com tarefas que não você não é capaz de concluir.


Autoconfiante
A confiança é um componente do sucesso. Mas o excesso dela leva o profissional a ignorar ou a menosprezar opiniões divergentes, prejudicando o próprio trabalho.
COMO CORRIGIR: “Valorizar-se demais é uma defesa às próprias
fraquezas”, diz Fernanda Pomin, sócia-diretora da consultoria Korn/Ferry, de São Paulo. Procure enxergar as qualidades de cada integrante da equipe e imaginar como eles podem colaborar com o seu desenvolvimento.


Bicão
Ser comunicativo é bom. Abusar dessa qualidade, não. Você pode parecer intrometido e carreirista.
COMO CORRIGIR: Comunicar-se bem é saber falar e, principalmente, ouvir. Você precisa perceber como o seu comportamento está sendo assimilado pelas pessoas a sua volta.


Centralizador
O sujeito sabe que é competente, mas centraliza porque só confia em si mesmo na hora de decidir.
COMO CORRIGIR: A responsabilidade é sua, mas aprenda a delegar. “É preciso praticar a confiança”, diz Laura Castelhano, diretora- geral da BPI, consultoria de outplacement, de São Paulo.


Proativo
Mesmo com a intenção de ajudar e ser resoluto, exagerar na iniciativa pode causar a impressão de que se está passando por cima de um colega ou da equipe.
COMO CORRIGIR: Observe o impacto de suas atitudes. Quando
alguém disser “Calma!” ou “Deixa comigo!”, pode estar querendo
dizer para você não ir além daquele ponto.


Condescendente
A compreensão é uma qualidade. O exagero, nesse caso, é ser bonzinho demais. Como a centralização, a falta de direção também prejudica a equipe.
COMO CORRIGIR: Sem virar um tirano, organize a equipe em torno do resultado. Se a pessoa pede para sair mais cedo, deixe, mas pergunte quando ela poderá repor se for necessário.


Rígido
Organização, pensamento lógico e rotina são importantes para o gestor. Mas o excesso de rigidez prejudicará o desempenho quando ocorrer algo fora do script.
COMO CORRIGIR: Procure entender que é impossível prever
tudo. Quem é organizado já está bem preparado para os imprevistos,
falta apenas aceitar que eles acontecem.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

“O empreendedor é um animal de caça"Jorge Gerdau Johannpeter responde perguntas de seis líderes empresariais sobre liderança,inovação,sustentabilidade

"A inquietação do empresário é uma coisa extraordinária". A frase é de um dos maiores empresários brasileiros de todos os tempos: Jorge Gerdau Johannpeter. Na noite desta terça-feira, em Porto Alegre, a convite da Junior Achievement, o presidente do Conselho de Administração do Grupo Gerdau respondeu o questionamento de seis líderes empresariais sobre temas que, apesar de diferentes, se relacionam diretamente com a atividade empreendedora. "O empresário é o principal agente social. Não tem professor ou padre que transforme tanto a sociedade", afirma.

O time selecionado pela Junior Achievement, ONG de educação prática em economia e negócios, foi formado por pessoas conhecidas - e reconhecidas - no meio empresarial pelo sucesso de seus empreendimentos: José Galló (presidente da Lojas Renner), Marcelo Carvalho (co-presidente do Grupo Ancar Ivanhoe), Ricardo Felizzola (presidente do Conselho de Administração da Altus), Eduardo Bier (fundador e proprietário da Cervejaria Dado Bier), Antonio Tigre (vice-presidente de Gestão e Finanças do Grupo RBS) e Ricardo Vontobel (presidente do Conselho de Administração do Grupo Vonpar).

José Galló, da Lojas Renner - A palavra gestão sempre é associada a alguém que administra uma empresa. Perdi meu pai aos dois de idade. Comecei a gerir minha vida e minha carreira muito cedo. Na faculdade, estudei administração e me especializei em gestão de empresas de varejo nacionais em uma época em que era status ser gestor de indústria ou de entidade financeira. O que é ser um gestor, um empreendedor?

Jorge Gerdau Johannpeter - Fico entusiasmado ao ver jovens empreendendo. A figura do empreendedor é muito importante na sociedade. O empreendedor é um animal de caça, que tenta detectar alguma lacuna ou espaço aonde vai colocar um produto ou serviço. É ele quem analisa as oportunidades. Essa atitude é uma chama de inquietação, uma dádiva que cada um pode ampliar, ou não. O empresário é alguém que escolhe um produto ou serviço e depois assume riscos, capacita equipes, produz e oferta ao mercado. E o incrível é que ele faz tudo isso e, depois desse milagre todo, ainda paga impostos. O empresário é o principal agente social. Não tem professor ou padre que transforme tanto a sociedade quanto o empresário.

Antonio Tigre, do Grupo RBS - O que deve ser feito para desenvolver o espírito empreendedor e a liberdade de mercado. Como criar a atitude de se pensar grande?

Gerdau - O processo de educação dentro do empreendedorismo tem dimensões culturais muito grandes e está vinculado à liberdade de mercado, para que a pessoa dê vazão à sua capacidade criadora. A liberdade de empreender é um patrimônio extremamente rico. O Brasil e a América Latina têm um histórico que não estimula a educação empreendedora. Tivemos regimes autoritários, forte presença de Igrejas... que preferem militantes, gente que obedece, que não pensa demais. Já o empreendedor é um analista permanente, inquieto na busca de novos caminhos. Nosso papel, no sentido de educação, precisa ser muito forte nessa cultura histórica de militantes obedientes vinculados a padrões que ainda estão soltos por aí na América Latina. A capacidade de formar liberdade de mercado é nossa, dos empresários. Quanto mais empresários, mais agentes sociais importantes.

Ricardo Felizzolla, da Altus - A tecnologia e a inovação formam um fenômeno que se repete em comunidades que têm ambientes propícios a isso, onde se destaca a atitude empreendedora. Hoje, tudo que é criado numa ponta do mundo chega rapidamente do outro lado. Isso gera inovação, que produz riqueza às empresas. Empresas estas que, há dez anos, não existiam, e que hoje faturam bilhões. Vejo esses processos como as duas turbinas de um avião: uma é a gestão e a outra a inovação. Qual o segredo para começar, continuar e perpetuar um empreendimento?

Gerdau - Vicente Falconi, que é um guru da gestão, tem uma visão internacional, acadêmica e pragmática sobre isso. Ele mostra a importância do triângulo Liderança, Conhecimento e Processo. O processo se dá por meio de metodologia, de um sistema. Sem essa metodologia, o conhecimento se perde. A segurança significa a não perda, a maximização, o 6 Sigma, a satisfação do cliente. Quem lê os relatórios históricos da G&E vê que o 6 Sigma é algo quase sem falhas. Sobrevida e perpetuidade de uma empresa acontecem por meio da inovação. Não existindo isso, a tendência é de que o produto ou o serviço acabe morrendo. O processo de inovação tem que estar incorporado ao empresário, e pode acontecer de várias maneiras.

Na Gerdau, são 18 processos e em todos tentamos ser benchmark. Temos que captar recursos mais baratos, capacitar gente, trabalhar métodos. Inovação é inerente aos processos. Mesmo na vida individual, o empresário tem que se capacitar, inovar a atitude, ter atitude inovadora. Tudo muda e eu, empresário, tenho que ter a capacidade de me adaptar a isso. Hoje, a gente se forma na faculdade e no dia seguinte já estamos superados. Esse é o desafio da vida moderna. É quase assustador, mas preciso buscar a perfeição operacional e a inovação sobre todos processos que executo. O mundo se move para quem se mobiliza mais. É um desafio fantástico e que precisa incorporar a palavra benchmark. Deveria existir isso no setor público, mas não há. Como consequência, a sociedade é obrigada a carregar uma estrutura extremamente conservadora.

Marcelo Carvalho, do Grupo Ancar Ivanhoe - E a questão do capital humano? Qual o papel das pessoas num empreendimento? Elas são um patrimônio das empresas?

Gerdau - Trinta anos atrás eu disse: podem levar todos meus ativos, mas não levem minha equipe. É com essa equipe que vou conseguir fazer tudo ainda melhor do que na primeira vez. A diferença da empresa está na qualidade das pessoas. Gente motivada, entusiasmada, atinge patamares elevados de eficiência. Está em nossas mãos formar equipes felizes. Investir no crescimento das pessoas é um desafio fantástico. Hoje, as coisas estão nas prateleiras. É possível fazer uma montadora de veículos por telefone, mas duas áreas de uma empresa dependem do Homem: as equipes e o atendimento ao cliente. Isso varia conforme as lideranças e a capacidade de gestão que as empresas têm. Na Gerdau, são mais de 50 mil funcionários. Todos eles recebem, em média, 100 horas de capacitação ao ano. Existem tecnologias para desenvolver processos de motivação, que levam os empregados ao sentimento de pertencer a uma organização vencedora, dar a vida por isso.

Existem três processos que, ao longo de minha vida de CEO, sempre fiz questão de acompanhar: relações institucionais (processos políticos, defesa de interesses de stakeholders); planejamento com visão estratégica; e recursos humanos. É necessário sempre formar pessoal e procurar talentos. Hoje, se existe um problema, contrata-se um técnico para resolver. Isso o dinheiro compra. Já pessoas, talentos, não podem ser compradas. Pouco tempo atrás, um funcionário que trabalhava em Divinópolis (MG) faleceu vítima de câncer. Ele pediu para ser enterrado com o uniforme da Gerdau. Isso mostra valores que podem ser identificados. São valores de equipe, que se quer ter em casa, com a família, passar aos filhos, aos netos. Investir, educar e capacitar não tem limite.

Ricardo Vontobel, da Vonpar - Apesar das questões histórico-culturais mencionadas, as empresas latino-americanas têm sido bem sucedidas. São empresas bastante jovens, inclusive, que vêm tendo papel importante na transformação do Brasil de hoje. Qual a responsabilidade dos empresários na sociedade?

Gerdau - O empresário não pode se despir de sua responsabilidade de cidadão. Esse tema, no Brasil, tem dimensão ainda maior do que em países desenvolvidos, como os Estados Unidos e o Canadá. Isso acontece porque aqui existem grandes diferenças entre as classes sociais. A primeira responsabilidade social é ser sério na profissão. A segunda tem relação com a comunidade, a vizinhança, a paróquia. Já a terceira é uma que tenho tentado transmitir sem muito sucesso, aliás. É a responsabilidade social institucional. O líder empresarial deve transmitir conhecimento. Ele pode doar dinheiro e não ver o que vai ser feito. Pode doar dinheiro e acompanhar onde será investido. Ou então pode se engajar no processo e participar dele. A construção institucional do Brasil depende de nós, líderes, empresários. Temos sido omissos nisso. Os políticos eleitos são insatisfatórios e, por isso, temos que trabalhar ainda mais. O maior patrimônio de um empresário é sua capacidade de gestão e ele precisa levar isso adiante. Quem tem ônus de ser líder deve passar esse conhecimento. Tenho dúvidas se entrego para meus filhos e netos um país melhor do que recebi. Vejo essa bagunça toda no Senado e me questiono. Hoje, os desafios da globalização são complexos. Temos que ter visão da gestão da sustentabilidade econômica, ambiental e social. Tenho inquietações enormes nesses temas.

Eduardo Bier, da Dado Bier - Como suprir as necessidades atuais permitindo que as gerações futuras sejam sustentáveis? Hoje, o discurso é sustentável, mas a prática ainda está longe disso. Vejo aí um grande gap. O que é preciso fazer para se construir uma sociedade sustentável?

Gerdau - Existem três tipos de sustentabilidade: econômica, ambiental e social. Uma não vive sem a outra. Estas três atividades estão relacionadas. Isso, conceitualmente, está em evolução rápida, mas a plena conexão que existe entre elas ainda não está culturalmente incorporada. Se a gente analisar, numa visão de longo prazo, a econômica não se sustenta sem a ambiental. Ainda estou no aprendizado de como interligar os três processos, dentro dessa visão, que é tremendamente difícil em termos práticos. É necessário que se invista muito mais em tecnologia. Os investimentos em soluções tecnológicas não estão acompanhando o crescimento econômico. Acabamos aprendendo apenas com os erros e catástrofes. Faço essa análise e me incluo nesse processo de tentativa de entendimento. Temos que nos capacitar muito mais sobre o tema. Ao se deparar com uma floresta, os índios americanos se preocupavam em preservá-la até a sétima geração. Não é o que fazemos.